Na madrugada desta segunda-feira (23), o rio Madeira, em Porto Velho, atingiu a marca histórica de 25 centímetros, o menor nível já registrado. O impacto dessa seca severa tem sido devastador para as comunidades ribeirinhas, que dependem do rio para suas atividades diárias e, principalmente, para a pesca, que já não sustenta mais a sobrevivência dos moradores.
André Pinto, um pescador da região, expressa sua frustração com a situação crítica: "A gente vive da pesca, mas não há mais peixes. Você desce de canoa, sobe e desce o rio, e não pega nada". O cenário antes repleto de vida aquática agora é coberto por bancos de areia, tornando a pesca praticamente impossível.
Além da falta de peixes, as comunidades enfrentam a ausência de água potável. Em localidades como a comunidade Brasileira, os poços estão secos, e a população depende de água trazida pela Defesa Civil de Porto Velho. Porém, os moradores relatam que as entregas são insuficientes. "A Defesa Civil trouxe água no dia 9 de setembro, mas não voltou. Se não comprarmos água, ficamos sem beber", lamenta Elisa Regina, residente da comunidade, que precisa pagar R$11 por um galão de 20 litros, que dura pouco mais de um dia para sua família de cinco pessoas.
A Prefeitura de Porto Velho anunciou a distribuição de 15 mil fardos de água potável para 433 famílias, com previsão de atendimento por três meses. No entanto, os ribeirinhos questionam se essa ajuda será suficiente para enfrentar a severidade da seca e o calor extremo, que aumentam o consumo de água.
A seca não afeta apenas os humanos, mas também a fauna local. Peixes ficam isolados em lagoas e morrem por falta de alimento e oxigênio, enquanto animais como jacarés também sofrem com a escassez de presas. "A gente encontra os bichos mortos nas praias", conta André, que assiste impotente ao colapso ambiental.
Na comunidade Maravilha, o igarapé secou completamente, transformando o que antes era fonte de diversão e sustento em um cemitério de peixes. Conceição, uma moradora da região, descreve a tristeza de ver seu principal recurso natural destruído.
A situação também gera consequências econômicas. O rio Madeira é uma importante via de transporte, e a baixa no nível das águas causou uma redução de 60% no transporte de granéis sólidos, como soja e milho, no principal porto de cargas de Porto Velho. Segundo o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), esse corredor logístico, vital para a economia de Rondônia e Amazonas, pode resultar em aumento de preços ao consumidor final devido aos custos logísticos mais elevados.
A seca extrema vem acompanhada de um aumento recorde nas queimadas. Somente nas duas primeiras semanas de setembro, o número de focos de incêndio em Rondônia foi três vezes maior que o registrado nos primeiros seis meses de 2024. O estado já contabiliza 8.462 focos até o dia 19 de setembro, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o maior número em cinco anos.
As autoridades tentam conter os danos ambientais e punir os responsáveis. Até agora, mais de R$ 262 milhões em multas foram aplicados e 970 pessoas foram presas, 42 delas por queimadas ilegais, de acordo com o Batalhão da Polícia Ambiental de Rondônia.
Com a seca e os incêndios fora de controle, o futuro das comunidades ribeirinhas e do meio ambiente em Rondônia permanece incerto, enquanto a crise climática se agrava no estado.